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Outubro Rosa: O que ninguém te conta 

Neste período, inúmeras são as informações sobre a importância e a responsabilização do autocuidado feminino em relação à saúde


28 de outubro de 2022 por
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Psicóloga Bianca B. Pan Lopez, graduanda em Psicanálise.  

CRP 12/22421 

No mês de outubro, devido à importância de informar as pessoas acerca da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama, retratamos o respectivo mês como Outubro Rosa, visto que o câncer de mama é a primeira causa de morte por câncer na população feminina em quase todas as regiões do Brasil, com exceção na região Norte, o qual o câncer do colo de útero ocupa esse lugar, sendo a taxa de mortalidade por câncer de mama ajustada pela população mundial de 11,84 óbitos (100.000 mulheres), em 2020. 

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Neste período, inúmeras são as informações sobre a importância e a responsabilização do autocuidado feminino em relação à saúde. Aliás, quantas vezes nesse mês você leu propagandas que dizem “quem se ama, se cuida! ” Ou “o câncer tem cura, só depende de você! Previna-se.”?  Imagino que várias, pois tornou-se comum o apelo ao amor e à culpa para levar as mulheres a realizarem seus exames médicos regularmente. Com base na autora Boeira (2017), convido você neste momento para refletirmos um pouco sobre as implicações dessas estratégias no tocante à saúde da mulher.  

Desde a primeira menstruação, meninas são orientadas a busca de atendimento médico, bem como quando tem sua primeira experiência sexual, em especial com penetração, estas são orientadas a acompanhamentos médicos, preventivos, entre outros exames e até a recursos medicamentosos. Ou seja, a mulher, desde as suas primeiras manifestações de reprodução (de gestar), há um controle sobre seus corpos, de modo a recordá-las anualmente os riscos que estas correm a partir do momento em que escolhem ter a uma vida sexualmente ativa, como um corpo sujo que poderá resultar em adoecimento e precisa ser acompanhado.  

Se faz necessário ressaltar que tais exames e procedimentos costumam ser desconfortáveis, doloridos e com riscos graves atrelados que, em diversos casos, não são debatidos e discutidos com a mulher sobre seu próprio corpo e as intervenções propostas, isto é, não são divulgados os dados de riscos da efetuação desses exames, obtendo somente a narrativa e o discurso de um lado da história: o benéfico, quando também existem seus malefícios. Para melhor elucidar: indica-se a mamografia, levando em consideração a estimativa de que quatro a cada cinco mulheres que apresentam o câncer de mama possuem mais de cinquenta anos de idade, para mulheres entre cinquenta e sessenta e nova anos de idade a cada dois anos, entretanto, entre os anos de 2010 e 2013 observou-se a proporção elevada de mamografias e rastreamentos realizados entre mulheres de quarenta e quarenta e nove anos de idade, lembrando que a exposição a esse procedimento pode levar a indução do câncer de mama por radiação, entre outros riscos. Equivalentemente, diversos são os relatos de mulheres que tiveram seu diagnóstico precoce de câncer de mama e isso lhes oportunizaram melhores condições para o tratamento de sua doença.  

Outro ponto a ser mencionado é o fato de que no processo de autocuidado, estimulado pelos discursos médicos, na prática deixa muito a desejar, como por exemplo o exame da mamografia, em que é realizada em um ambiente asséptico, no qual um profissional técnico apenas orienta a mulher sobre o seu posicionamento e esta encontra-se sozinha vivenciando a experiência dolorosa do procedimento. De igual modo, conforme Serpa (2022), a população preta e pobre se torna ainda mais desamparada divido os empasses de uma estrutura histórica e socialmente racista e a falta de recursos econômicos acabam por carecerem de um atendimento adequado, intensificando o sofrimento. Portanto, questiono se de fato se importam com a saúde da mulher ou se o maior interesse está vinculado ao controle dos corpos femininos, pois, me diga você, mulher, como enxerga a manipulação do seu corpo pela ciência médica? 

Neste contexto, o viver passou a ser entendimento e sentido, de maneira agravada, como o controle da doença e do adiamento da morte, como também sobressai a ideia de que sempre se é possível melhorar alguma coisa no nosso corpo, e assim vivenciamos os paradoxos de que as tecnologias de governo na mesma medida em que fabricam os riscos, também nos ensinam e orientam a cuidarmos de nós mesmos e de nossos próximos para nos protegermos das múltiplas eventualidades que podem afetar nossas vidas. 

 A referente reflexão não tem como objetivo dizer que o ideal é as mulheres se exporem ou não a tantos exames preventivos e de rastreamentos, mas possibilitar que elas, através de um olhar crítico, tomem suas decisões a partir do seu desejo e necessidade e não de maneira alienada, pois em suma o corpo feminino acaba por ser manipulado, sem ser ofertado a elas informações completas sobre as intervenções em seu próprio corpo e sem a construção de um sentido para aquela que vivência e, por vezes, sente-se culpada caso não se coloque na condição constante de avaliações médicas que trazem implicações físicas e psicológicas.  

Referências bibliográficas:  

BOEIRA, Laura dos Santo. A manipulação do corpo feminino na construção do conceito de prevenção em saúde: reflexões sobre os exames de rastreamento de câncer em mulheres. 2017. 

FREITAS, Débora Duarte; MAROCCO, Vanessa; LOCKMANN, Kamila. Formas de educar produzidas nas relações de saber-poder: os discursos da saúde nas revistas veja e carta capital. Atos de Pesquisa em Educação, v. 15, n. 1, p. 4-25, 2020. 

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Atlas da mortalidade. Rio de Janeiro: INCA, 2022. Base de dados. Disponível em: <https://www.inca.gov.br/app/mortalidade> Acesso em: 18 de outubro de 2022 

SERPA, Evelin Duarte et al. Experiências de mulheres negras ao adoecer por câncer de mama: A imanência do sofrimento e cuidado. Research, Society and Development, v. 11, n. 10, p. e175111032674-e175111032674, 2022. 

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